Aproveitamento de resíduos e subprodutos agropecuários

O Brasil como país tropical, apresenta excelentes condições para a exploração de ruminantes em pastagens, porém em determinados períodos do ano, a dificuldade de adquirir alimentos volumosos em regiões áridas e semi áridas, em épocas secas, torna-se uma árdua e difícil tarefa para muitos produtores rurais. Neste contexto, aparecem os resíduos e os subprodutos agropecuários, como as palhas, o bagaço de cana-de-açúcar, etc. que podem oferecer excelente opção como alimentação alternativa para os ruminantes, já que sendo animais poligástricos, possuem um aparelho digestivo especial, capaz de converter resíduos e subprodutos agropecuários sem utilidade alguma na alimentação humana, em carne, leite, lã, etc.

Palhas e outros alimentos desta natureza, de um modo geral, são extremamente pobres em nitrogênio e apresentam pouca solubilidade da parede celular. Esses alimentos podem apresentar grande diferença em seu valor nutritivo. Pode existir mais diferença entre uma palha da mesma espécie que entre distintas variedades. Ademais de estas possuírem baixa digestibilidade, possuem freqüentemente pouca palatabilidade, razão pela qual sua ingestão voluntária é limitada. Isto dificulta o atendimento das necessidades dos animais que as consomem, quando administradas como fonte única de nutrientes. Materiais lignocelulósicos quando são administrados na alimentação animal, sem um prévio tratamento, proporcionam insuficientes quantidades de minerais, energia e proteínas para manter sequer o peso corporal dos animais.

Os resíduos originados da cana-de-açúcar, após seu esmagamento nas moendas, geralmente coincide com este período de escassez de forragem em determinadas regiões. Isto, aliado ao fato desta enorme quantidade de biomassa produzida nas usinas de açúcar e destilarias, sendo o bagaço o principal resíduo fibroso.

Existem algumas maneiras práticas de melhorar o aproveitamento do bagaço na alimentação animal. O tratamento químico é uma delas. A técnica é de fácil manuseio, relativamente barata e bastante acessível aos produtores.

A finalidade básica do tratamento é a hidrólise que ocorre dentro da parede celular, causando o rompimento da forte ligação entre a lignina e a celulose, fazendo com que a primeira sendo indigesta, seja expulsa dentro do trato gastrointestinal e assim sendo, sabe-se que a oferta de alimentos para o homem, exige um crescimento superior da pecuária em relação a agricultura, além do fato de necessitarmos minimizar ao máximo a concorrência entre o homem e os animais domésticos, em relação aos alimentos concentrados. Desta forma, resíduos como o bagaço e outros volumosos inevitavelmente produzidos por ocasião de diversas cultura em todo o mundo, devem ser maximizados na alimentação dos ruminantes.

A América Latina produz mais de 500 milhões de toneladas (t) de subprodutos e resíduos agroindustriais. O Brasil, produz mais desta metade. Embora esses materiais volumosos sejam pobres em nutrientes, eles podem suprir em parte das necessidades energéticas dos animais, se previamente tratados e melhorados para este fim. Estes materiais são geralmente abundantes em fibra e ricos em lignina e sílica, entretanto o potencial de celulose que existe nestes subprodutos e resíduos e que podem servir como fonte de energia para os animais ruminantes é um fato conhecido há mais de um século.

A oferta e demanda de alimentos para a população humana nos países em desenvolvimento exige a cada dia que o crescimento da pecuária seja superior ao da agricultura. Na atualidade, é necessário restringir ao máximo a competição de alimentos concentrados entre homens e animais. Estima-se que um terço dos cereais produzidos no mundo se destina à alimentação dos animais domésticos, em detrimento da população humana, carente destes produtos. Assim, deve-se recomendar e orientar cada vez mais o uso de subprodutos e resíduos lignocelulósicos na alimentação animal, quando devidamente tratados e corretamente administrados na dieta dos ruminantes.

Os subprodutos e resíduos agroindustriais como as palhas, o bagaço de cana-de-açúcar, casca de arroz, etc. são materiais fibrosos e inevitavelmente produzidos devido a diversos cultivos, principalmente os cereais e cultura da cana-de-açúcar.

A quantidade disponível destes materiais é muito grande em todo o mundo e basta dizer que se fossem utilizados apenas 5% de maneira correta na alimentação animal, poderia suprir as necessidades dos rebanhos existentes no mundo e assim atender as demandas de energia e proteínas da população mundial, carente e necessitada. O baixo valor alimentício de materiais lignocelulósicos está relacionado com o alto grau de lignificação da parede celular, do reduzido conteúdo de matéria nitrogenada e de minerais, exceto o potássio, além do escasso teor de vitaminas.

Pesquisadores em todo o mundo estimam que no ano 2000 não haverá alimentos concentrados disponíveis em quantidades suficientes para a alimentação de animais ruminantes. Desta forma, haverá competição direta entre o homem e o animal no que se refere ao consumo de alimentos concentrados. Assim, torna-se necessário planejar desde já a alimentação destes animais para o próximo milênio que se aproxima.

Ao longo desses anos, diversas entidades governamentais e não governamentais, quer seja por iniciativa própria, ou mesmo recomendados por organizações como a ONU, buscam incansavelmente soluções sistemáticas quanto ao aproveitamento desses subprodutos e resíduos na alimentação animal. Na verdade, esses materiais, quando adequadamente tratados e tecnicamente orientados na alimentação animal, podem representar um enorme benefício à população mundial.

O elemento básico diferenciado na composição química desses materiais, em comparação com outros alimentos de origem vegetal utilizados para animais ruminantes e não ruminantes, é seu conteúdo de carboidratos estruturais, principalmente a celulose e hemicelulose, que corresponde a 70%-80% da matéria seca, assim como seu elevado teor de lignina (6%-12%), devido ao alto grau de amadurecimento da planta no momento da colheita. Também é baixo o seu conteúdo de proteína bruta, além de sua digestibilidade.

A composição química desses materiais, assim como o valor nutritivo, depende de vários fatores. O grau de amadurecimento da planta é um deles, pois a maioria dos nutrientes são translocados para as sementes e frutos e desta maneira, poucos nutrientes permanecem em outras partes da planta. Outros fatores podem ainda afetar a composição química e o valor nutritivo de subprodutos e resíduos, como a fertilização dos solos, condições climáticas e manejo da cultura, principalmente.

Esses materiais são constituídos por três grupos de compostos orgânicos principais:

a) Celulose

b) Hemicelulose

c) Lignina

A celulose é uma substância orgânica, notavelmente pura, formada unicamente por unidades de glicose que se unem para formar uma molécula gigante de cadeia reta (Stacey, 1976). Segundo Coelho-da-Silva (1984), a celulose é o composto químico orgânico que existe em maior abundância nas plantas e em toda a superfície terrestre. É aproveitada pelos ruminantes em diferentes graus, com valores que oscilam desde 20% até 90%. As hemiceluloses estão geralmente relacionadas com as gomas vegetais, com cadeias moleculares mais curtas que as celuloses e derivam, principalmente, de cadeias formadas pelo açúcar pentose (Staniforth, 1986). As ligninas são compostos aromáticos e têm como função principal nos tecidos vegetais, proporcionar rigidez, resistência e defesa contra enfermidades (Staniforth, 1986). O conteúdo de lignina nas plantas aumenta com a maturidade fisiológica. Este componente está sempre relacionado com a indigestibilidade das fibras da dieta. Sabe-se que a lignificação da parede celular em maior grau nas plantas, se deve a seu amadurecimento, fator responsável pelo baixo valor nutritivo nas mesmas.

Tratamentos químicos

Devido ao incremento na alimentação animal e seu enorme potencial como recurso alimentar para os ruminantes, os resíduos lignocelulósicos têm sido motivo de intensas pesquisas em todo o mundo, com a finalidade de melhorar seu aproveitamento e valor nutritivo através de métodos químicos. Assim, faz quase um século que esses materiais são tratados quimicamente e utilizados na alimentação animal.

O tratamento químico é o método mais eficiente de incrementar o valor nutritivo dos materiais fibrosos para uso na alimentação animal. Segundo Sundstol (1988), foi Beckmann, em 1919, na Alemanha, quem desenvolveu um método à base de NaOH para o tratamento de palhas. Este método incrementava a digestibilidade da matéria orgânica (MO) entre 46% e 71%. A partir daquela data, o método Beckmann foi melhorado, desenvolvido e adaptado às condições da Noruega. Na década dos anos 60, o uso de palhas tratadas por este método se tornou muito popular na Europa.

O tratamento químico dos resíduos agrícolas com bases fortes como os álcalis, não afeta a atividade microbiana do rúmen e o principal efeito do tratamento é melhorar a digestibilidade da fibra, podendo-se conseguir incrementos de 43% a 70%.

Neste sentido, pesquisas têm demonstrado que palhas de cereais, ao serem submetidas a tratamentos com NaOH, NH3 e uréia, podem aumentar a ingestão voluntária, a digestibilidade e o valor nutritivo.

Atualmente o método químico mais indicado para tratamento de resíduos lignocelulósicos é o método com uréia. É largamente conhecido que o consumo de palhas é melhorado através do tratamento químico com uréia, aumentando entre 30% e 70%, segundo o tipo de resíduo usado na alimentação. O incremento em seu valor nutritivo depende de diversos fatores, como, por exemplo, o conteúdo de umidade, percentual de uréia utilizado, temperatura durante o tratamento, tempo de tratamento, fatores como percentual de uréia, nível de umidade final, temperatura ambiente e tempo de tratamento, são decisivos para o sucesso da técnica.

Percentural de uréia – deve ser usado 5% com base na matéria seca;

Umidade final – recomenda-se 40%

Tempo de tratamento – está relacionado com a temperatura ambiente, pois temperaturas amenas, prolonga-se este tempo;

Temperatura – em países com clima tropical, apenas de 7 a 10 dias.

Mais informações sobre APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS E SUBPRODUTOS AGROPECUÁRIOS PELOS RUMINANTES na Embrapa Tabuleiros Costeiros, Av. Beira-Mar, 3250, Cx Postal 44, Cep.: 49001-970, Aracaju-SE, Fone:(079) 226 1344, Fax: (079)217 7251. E-mail: sac@cpatc.embrapa.br

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